Boticários, farmacêuticos e indústria: A evolução do medicamento no Brasil

As raízes da farmácia no Brasil remontam às boticas coloniais, estabelecimentos rudimentares onde se comercializavam remédios à base de plantas e preparos empíricos. Administrados por boticários — figuras sem formação acadêmica, mas com conhecimentos tradicionais —, esses locais operavam com autorizações precárias da corte portuguesa em Coimbra. A regulamentação comercial das boticas (1640) impulsionou sua proliferação, mas manteve práticas pouco científicas, perpetuando a dependência de saberes populares.

A profissionalização só ganhou contornos modernos no século XX, quando o farmacêutico emergiu como especialista qualificado, responsável pela preparação, dispensação e orientação terapêutica. As farmácias, então, tornaram-se espaços de saúde pública. Contudo, a industrialização dos medicamentos — acelerada após a Segunda Guerra Mundial — redefiniu esse papel. Os EUA, substituindo a Alemanha como potência farmacêutica, massificaram a produção sintética, abandonando os extratos vegetais artesanais. No Brasil, essa transição teve nuances críticas.

A Industrialização e seus Paradoxos

Enquanto países desenvolvidos investiam em inovação, o Brasil seguiu um caminho dependente:

  • Décadas de 1930-50: Empresas nacionais surgiram de antigas boticas, mas sob domínio crescente de multinacionais.
  • Anos 1970-90: Leis estruturantes (como a RENAME e a criação da ANVISA) coexistiram com a falta de patentes (Lei 5.772/71) e a produção de genéricos pós-1999.
  • Século XXI: O parque industrial permaneceu reativo — reproduzindo tecnologias estrangeiras e focando em similares, com pouca pesquisa autóctone.

Conclusão Crítica

A história farmacêutica brasileira é marcada por tensões: entre o empírico e o científico, entre o local e o global, entre a saúde pública e os interesses comerciais. Se a industrialização trouxe acesso a medicamentos, também distanciou o farmacêutico da comunidade, reduzindo-o a um dispensador de produtos prontos. Hoje, o desafio persiste: como equilibrar escala industrial, inovação e atenção humanizada?