Cada indivíduo é uma peça do quebra-cabeças

Trabalho em equipe

Quero deixar disponível um excelente conteúdo sobre a convivência humana no trabalho, mas que sem dúvida alguma vale para qualquer tipo de relação humana. Faço um recorte abordando como introdução a cristalização, um processo psíquico onde o indivíduo se agarra as próprias convicções na medida que se fecha para a mudança pelos outros, regado com pouca esperança de um mundo melhor para a sociedade.

[…] Determinação, iniciativa, acomodação ou desânimo não são atributos individuais, mas o resultado das relações que se estabelecem no trabalho das equipes.

As equipes vivem imersas nas relações de poder, de afeto, de trabalho e de gênero. São relações sociais, históricas e culturais que produzem pensamentos, sentimentos, modos de agir e pensar. Nas equipes estão também as disputas das relações de gênero: homem e mulher; as relações afetivas: prestígio e subordinação, favorecidos e desfavorecidos; as relações de classe e as decorrentes da diversidade cultural.

Então, a equipe é um tecido de relações: presentes e passadas, de poderes, de saberes e de afetos. Relações entre diferentes profissionais, permeadas pelas relações entre trabalhadores e usuários. São pessoas com formações, saberes, práticas e histórias que se encontram ou desencontram no trabalho de cuidar de pessoas e comunidades.

Pode-se  compreender que cada um tem motivação para estar naquele emprego por várias particularidades quase sempre distintas dos demais, em referência ao invisível das relações como determinantes: porque precisa muito do salário; porque acredita que está ajudando a população; porque foi o emprego que encontrou no momento; e etc. São questões transacionais, que vindo do outro quase sempre não imaginamos que podemos sofrer o mesmo em algum momento da vida, mas que naquele instante pode ser motivo de divergência e indiferença.

A equipe oferece uma possibilidade de reconstrução permanente. Nela há momentos de maior potência de trabalho e momentos de maior desarticulação, de desânimo e de resistência.

Para que haja uma permanente renovação na equipe é necessário reconhecer que na saúde são necessários distintos olhares, saberes e fazeres. É preciso cooperar uns com os outros em prol de um objetivo comum: o cuidado.

As relações da equipe podem ser tensas e conflituosas e ninguém gosta de conflitos, pois aprendemos que eles são ruins. No entanto, eles evidenciam diferenças que devem ser explicitadas e trabalhadas, pois trazem a possibilidade da mudança.

Ao serem nominados e expressos, os conflitos podem mudar de qualidade e se transformar. A aprendizagem ocorre quando há a possibilidade de superar momentos, transformando dilemas em problemas de gestão e crescimento coletivos.

A abordagem dos conflitos como problema possibilita o que chamamos de problematização. Algo que permite a troca e o movimento das ideias, compreensão e decisões.

[…]

As reuniões de equipe, para serem proveitosas, têm de ser organizadas com clareza de objetivos e tarefas, sabendo-se onde se quer chegar. Devem também ser realizadas em um clima de respeito entre os participantes. Atrasos, entra e sai da sala, dificuldades para vencer a pauta ou elaborar propostas, término da reunião por esvaziamento indicam dificuldades no funcionamento da equipe.

[…] em uma equipe estão presentes, também, os interesses e os objetivos individuais. Esses objetivos, individuais ou do grupo, no entanto, podem se modificar, para que a equipe desenvolva tarefas comuns, direcionadas por objetivos comuns. Para isso, as pessoas precisam conversar, dialogar, expor seus pontos de vista, assim como escutar o que os outros têm a dizer.

[…] Cada pessoa, ao integrar uma equipe, traz consigo suas experiências pessoais e de trabalhos já realizados individualmente ou em outras equipes. Cada um tem seu jeito próprio de fazer as coisas e no trabalho em equipe somos levados a encontrar outras pessoas para que possamos trabalhar.

De certa maneira, o trabalho em equipe permite a cada um dos seus membros um “reencontro” da imagem que faz de si com a imagem que faz do outro.

Para que o trabalho em equipe aconteça de fato é necessário um esforço contínuo de cada um de seus membros, no sentido de atualizar ou reconstruir essa imagem que tem de si e do outro, já que há uma tendência de “cristalização” e isso impede ou dificulta os relacionamentos dentro da equipe.

As condições para que haja na equipe um espaço de fala e escuta, respeito mútuo e confiança são: disponibilidade interna, cooperação e aceitação das diferenças, confiança na capacidade de transformação pessoal, escuta e acolhimento.

[…] A cooperação e aceitação das diferenças […] um elemento que enriquece a equipe, pois torna claro que cada um tem “saberes”, “dizeres”, e “fazeres” diferentes e que é preciso ultrapassar preconceitos para a execução da tarefa. O oposto […] é a competição.

[…] Através da fala, as diferenças se tornam explícitas, podendo, assim, serem entendidas e acolhidas.

Fonte: Curso de capacitação para Agente de Combate a Endemias, AVASUS, Cap. 6